Um adeus a José Saramago
“Todos os dicionários juntos não contêm nem metade dos termos
de que precisaríamos para nos entendermos uns aos outros.”
José Saramago
Hoje pela manhã, Portugal perdeu um de seus maiores escritores contemporâneos: José Saramago. Em consequência de uma falência múltipla dos órgãos, Saramago faleceu aos 87 anos. Dentre seus livros, o mais conhecido é “Ensaio sobre a cegueira” (1995), que rendeu-lhe o Prêmio Nobel de Literatura em 1998 e recentemente foi adaptado para o cinema. Outra obra que obteve bastante expressão foi “O Evangelho segundo Jesus Cristo” (1991), que apresenta o texto biblíco descrito sobre ótica do próprio Jesus, retratado mais em sua faceta humana que divina. Conhecido pelo seu ateísmo, Saramago participou de polêmicos debates com a igreja católica ao lançar esta obra.
Todas as obras, no entanto, são carregadas de poesia e traduzem o olhar do autor sobre os valores da cultura ocidental e os dilemas de que os homens compartilham ao conviverem uns com os outros. A morte, que hoje chega ao autor, foi um tema abordado em diversas de suas obras. Em “As intermitências da morte” (2005), por exemplo, Saramago nos conta a história do dia em que a Morte resolveu “tirar férias” e determinar que a partir daquele dia, ninguém mais morreria. Ao criar estas situações absurdas, suas histórias nos levam a desnaturalizar aquilo que tomamos como óbvio, imediato e nos lançam perante reflexões como: e se ninguém mais morresse? E se todos fossem cegos?
Abaixo segue essa resposta de Saramago, que mais do que sua opinião sobre a eternidade, pergunta que o entrevistador lhe fizera, traz também uma visão do próprio autor sobre sua obra:
“Não acredito na vida eterna, embora vá inventando formas de dar alguma eternidade à vida. Quando invento [em Todos os Nomes] uma conservatória onde estão todos os nomes e um cemitério onde estarão todos os mortos, no fundo é uma forma de dar eternidade àquilo que não é eterno, ou pelo menos dar-lhe permanência. Se não fosse essa história do meu irmão, talvez escrevesse um livro chamado Todos os Nomes, mas seria outro totalmente, porque a minha busca dos dados referentes a ele é que me leva, no romance, a dar numa conservatória. Parece haver uma espécie de predestinação em tudo aquilo que faço. Há coisas que acontecem e que suscitam outras idéias, portanto é tudo uma questão de estar com atenção ao modo como essas idéias se desenvolvem. Algumas delas não têm saída, mas há outras que encontram seu próprio caminho. Não escrevo livros para contar histórias, só. No fundo, provavelmente eu não seja um romancista. Sou um ensaísta, sou alguém que escreve ensaios com personagens. Creio que é assim: cada romance meu é o lugar de uma reflexão sobre determinado aspecto da vida que me preocupa. Invento histórias para exprimir preocupações, interrogações…”