Agora. Agora. E agora.
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Há muito tempo atrás, e ponha tempo nisso, um homem estava só, sentado sobre uma pedra. Era noite de lua, calma, clara, linda, a ponto de, até o vento ter se esquecido de ventar por tanto encantamento. O homem diante deste cenário fantástico, trouxe `a memória a imagem das pessoas que amava. Como se a pedra que estivesse sentado desejasse se tornar lua, multiplicou seu tamanho, ao ponto de tudo assim se tornar, até o coração do homem . Essa lua que sentia no peito se chamava saudade. Cada vez mais frio e rígido, o homem decidiu extrair de si tal lua que lhe tomava. Soltou um grito sofrido, como o uivo dos lobos, e ganhou vida no ar toda a saudade do mundo. Nesse momento, nascia o Passado e no seu vento, sopravam a saudade, a culpa e a angústia.
No outro dia, pela manhã, o mesmo homem continuava sentado sobe a mesma pedra. Não conseguia dormir de tão impressionado que ficou na noite anterior. Pensava: se da memória das pessoas que amo consegui criar o passado, serei capaz de criar o momento em que me reencontrarei com elas? Apesar de continuar sentado sobre a pedra, seu pensamento ventava dentro de sua cabeça. Levantava telhados, arrancava árvores, batia brutalmente as portas, a ansiedade que desejava, mais do que tudo, rever as pessoas queridas. Como se a pedra que estivesse sentado fizesse parte de seus pensamentos, o vendaval da ansiedade tentou arrastá-la, mas o peso do corpo do homem não permitia que ela se movesse. Como um cabo de guerra, de um lado o vento tentando arrastar a pedra, do outro o homem pesando sobre ela, a corda rompeu, e ao romper, esparramou faíscas de ansiedade no ar. Nesse momento, nascia o Futuro e o seu vento soprava contrária `a corrente do Passado. O vento do futuro era veloz e corriam nele a pressa, a impaciência e a dispersão.
De cima da pedra, o homem olhava a poeira que levantou o vento do Futuro. Insatisfeito em pensar em arrumar aquela bagunça, sentiu em suas costas um vento frio. Lá vinha o Passado, e do encontro de seus ventos com os do Futuro, caiu aquela chuva. Gotas de saudade misturadas com as de pressa, as de culpa junto das dispersas e o homem assistia a tudo sentado sobre a pedra. Trovões murmuravam, raios caiam e adivinhem?
– O homem continuava sentado sobre a pedra. Há mais de vinte e quatro horas, sem levantar sequer para ir ao banheiro, a chuva cai sobre ele, o vento que lhe assanha os cabelos e nada o faz levantar da bendita pedra! Por acaso o nome desse cidadão é Mármore? Granito? Ônix?
Fazedor de Tempo. Foi assim que ficou conhecido, como a pessoa capaz de assistir em paz, a briga das gotas de chuva.
De todas as chuvas, essa foi a mais longa, pois nenhuma das correntes deram o braço a torcer. Muitos contam que, depois de tanto tempo, ela ainda não cessou.
– E o Fazedor de Tempo? Não vá dizer que ele ainda continua sentado sobre a pedra?
Sim, o homem permanece lá, só e sentado sobre a pedra, apreciando a chegada de cada gota de chuva na terra. Primeiro ele deu vida ao Passado, depois ao Futuro e do conflito entre os tempos, nasceu inesperadamente o Presente. Inesgotável. Uma incessante sequências de agoras. E foi em um agora como esse, que o Fazedor de Tempo e sua pedra receberam do Presente, o presente de serem eternos.
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por Karla Jacobina
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